DC – A Voz do Cidadão https://www.avozdocidadao.com.br Instituto de Cultura de Cidadania Thu, 17 Jan 2019 12:36:30 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.2.6 163895923 Artigo – Do Congresso em Foco: “A falta que a cultura faz”, por Jorge Maranhão https://www.avozdocidadao.com.br/artigo-do-congresso-em-foco-a-falta-que-a-cultura-faz-por-jorge-maranhao/ https://www.avozdocidadao.com.br/artigo-do-congresso-em-foco-a-falta-que-a-cultura-faz-por-jorge-maranhao/#respond Thu, 17 Jan 2019 12:36:19 +0000 http://www.avozdocidadao.com.br//?p=30022

Talvez pelo vício de restringir a cultura às suas meras expressões artísticas, intelectuais, folclóricas ou de lazer. Ou às pautas dos suplementos de artes e espetáculos da grande mídia. Esquecendo-se de suas manifestações judiciais, morais, religiosas e ideológicas. E, no máximo, estabelecendo suas relações com a economia, irmã gêmea da política. Quando não insistem em diagnosticar e prever o desenrolar dos fatos políticos em comparação com fatos tidos como semelhantes e ocorridos em tempos passados.

Já os analistas e críticos culturais se obrigam à dura tarefa de estabelecer relações entre os mais variados campos da expressão cultural, incorporando para tal, os recursos conceituais da filosofia da arte e da cultura. Mas não têm a merecida visibilidade por parte da grande mídia dominada pelo imediatismo da cobertura política e econômica, quando não social e criminal.

Para além da proposta de uma nova visão de nossa identidade, trata-se de uma estratégia de argumentação sobre a fadiga da República como nossa maior farsa “progressista”, ao mesmo tempo da descoberta desconcertante de nosso atávico conservadorismo, amor mesmo pelas nossas tradições.

Sobretudo pelo nosso gosto pelas torções, contorções e distorções barroquistas, pura cultura brasileira desastrosamente transbordada para a política, a justiça, a moral e os costumes, sem reconhecimento crítico, mas apenas tomada como nosso “jeito” (ou jeitinho?) de ser.

Tenho trabalhado nos últimos anos – sobretudo a partir das megamanifestações de 2013 de uma emergente classe de cidadania política – com a hipótese de esgotamento de nosso legado cultural barroquista e com a promessa, enfim, de inauguração de uma era iluminista de nossa cultura.

Nesse sentido, tenho defendido a tese de que talvez estejamos vivendo o momento histórico de superar definitivamente a hegemonia barroquista em que estamos enredados há quatro séculos. Mas talvez não estejamos percebendo.

Todavia, todo cuidado é pouco, pois se o iluminismo europeu, impregnado de romantismo, denunciou o esquerdismo como a doença infantil do comunismo, o nosso legado barroco, manco de Renascença e Iluminismo, só agora, depois de um século de defasagem e desastroso transbordamento cultural, está a denunciar nosso esquerdismo como a doença senil do barroquismo.

Nenhum de nossos maiores ficcionistas, sábios ou profetas poderia imaginar essa verdadeira reviravolta dada por nossa cultura política nos últimos anos. Chamaria mesmo de radical torção, um verdadeiro cavalo de pau de nosso legado contorcionista.

Mesmo os grandes intérpretes do Brasil – dentre os mais de 50 que inventariei em meu novo livro – denunciaram causas e fenômenos singulares de nossas raízes históricas e culturais, como o patrimonialismo e o corporativismo, o familismo e o cunhadismo, o coronelismo e o patriarcalismo, o fisiologismo e o bacharelismo.

Mas nenhum culminou no fenômeno mais abrangente, e causa última a meu ver, de todo o complexo cultural brasileiro como o barroquismo, do qual esses outros lhe seriam meros caudatários ou mesmo de incidência setorial nos âmbitos da vida social, familiar, artística, econômica, política ou moral, com suas características mais gerais de gosto pela retórica da farsa, do paradoxal, da ironia, alegoria, paródia e hipérbole.

Para além da proposta de uma nova visão de nossa identidade, trata-se de uma estratégia de argumentação sobre a fadiga da República como nossa maior farsa progressista, ao mesmo tempo da descoberta desconcertante de nosso atávico conservadorismo, amor mesmo pelas nossas tradições, e sobretudo nosso gosto pelas torções, contorções e distorções barroquistas. Nosso libidinal gozo com o arrocho das volutas da cultura nas fartas espirais da natureza.

Aliás, neste meu novo livro, faço um vasto inventário de nossos costumes barroquistas, em todos os campos da expressão cultural nacional para além das artes e das letras barrocas, e que podem ser simbolizados pelas figuras centrais das volutas e espirais barrocas, sobretudo como figuras de representação retórica do paradoxo, da farsa, da ironia e da hipérbole.

Redobradas e desdobradas volutas como formas de se ir para a direita pelo sentido da esquerda e para a esquerda pelo sentido da direita. Torções, retorções, contorções e distorções em campos tão insuspeitos como os registros históricos, os feitos empresariais, os processos judiciais, políticos, culturais e sobretudo morais.

Somos assim mesmo, o estilo da arte barroca do século XVI, sem a mediação e temperança da boa forma e da justa medida da Renascença que lhe antecedeu, nem tampouco da prudência e do equilíbrio da cultura iluminista que lhe sucedeu, desde o século XVII e XVIII, transbordou para todo o complexo cultural brasileiro, nossa chamada mentalidade barroquista, nosso apego à uma visão de mundo moldada em torções, contorções e distorções da realidade.

Enfim, nosso espírito hiperbólico, irônico, alegórico, paradoxal, parabólico, farsesco e burlesco, com que vemos, nos inserimos e tratamos tudo em nossa volta. E reviravoltas.

Meio a nosso barroquismo moral pleno de relativismo, os recursismos de nosso Judiciário plenos de atenuantes e agravantes e a farsa, para não dizer a burla, de nossa política que quer a todos enganar por todo o tempo, eis que um capitão imbuído dos valores da ordem, da disciplina e hierarquia aprendidos no Exército, se empenha em levar ao cenário central de nosso barroquismo político, o Congresso Nacional, o bom senso e a clareza do senso comum, tal qual a fábula O rei está nu, de Hans Christian Andersen.

Só não ouviram os que não quiseram ouvir a voz do capitão que representava a indignação de milhões de cidadãos desde as megamanifestações de 2013 em repúdio aos desmantelos e esbulhos de nossa cínica classe política.

A partir daí, tem sido definitivo o exercício de outro valor muito caro aos militares, a humildade de reconhecer seus próprios limites e se cercar dos melhores de cada área em que terão de atuar.

Assim, o capitão está a convocar os melhores da alta cultura brasileira para pôr em prática políticas públicas plenas de razoabilidade e efetividade, o que pode resultar numa oportunidade histórica de passarmos para uma era iluminista de afirmação do bom senso e do senso de proporção, de desapego, enfim, pelo adjetivismo, ornamentalismo e as desmesuras da vã retórica barroquista.

Para além de um novo governo, o que vemos no Brasil é um grande embate entre duas grandes tradições culturais do Ocidente, o iluminismo e o barroquismo em que temos vivido imersos todos esses séculos, por não conseguirmos reunir verdadeiras elites para empreender, enfim, a mudança do paradigma cultural da vã retórica populista para a ordem da razão no trato da coisa pública.

Nesse sentido, é um equívoco extinguir o equipamento público de maior garantia de transformação cultural contra a hegemonia da revolução cultural na área da mídia privada que teve vigência nos últimos governos petistas.

Para além do desaparelhamento esquerdista nas áreas da educação, da Justiça e das artes, se faz urgente não apenas um Ministério da Cultura, mas sobretudo uma rede de televisão pública. Assim como uma campanha pelo senso comum do cidadão comum.

Aliás, uma única rede pública não pesa no orçamento se for gerida harmônica e independentemente pelos três poderes da República, extinguindo-se esta jabuticaba barroquista de três redes para cada um dos três poderes chamarem de sua, e apenas fazerem propaganda corporativa de seus feitos, uma prova de quão desarmônicos e dependentes são de suas desmesuras.

Sobretudo uma única rede pública, como a BBC, mantida pela assinatura de seus usuários voluntários, os cidadãos, e os compulsórios, com parte ínfima do orçamento publicitário astronômico que empresas e autarquias federais destinam às redes privadas de conteúdo duvidoso.

Manter uma única rede de televisão pública até mesmo como reguladora da pluralidade cultural, ideológica e doutrinária e na conservação de nossas tradições e costumes, que deveria haver na mídia privada, mas não há, é uma oportunidade única de garantir a restauração dos valores morais da tradição ocidental judaico-cristã anunciada pelos ministérios da Educação e Relações Exteriores, uma vez que é a cultura a determinante estratégica do próprio sucesso das políticas econômicas e sociais a serem implementadas.

]]>
https://www.avozdocidadao.com.br/artigo-do-congresso-em-foco-a-falta-que-a-cultura-faz-por-jorge-maranhao/feed/ 0 30022
Artigo – Do Diário de Comércio de São Paulo: “O despertar do gigante”, por Jorge Maranhão https://www.avozdocidadao.com.br/artigo-do-diario-de-comercio-de-sao-paulo-o-despertar-do-gigante-por-jorge-maranhao/ https://www.avozdocidadao.com.br/artigo-do-diario-de-comercio-de-sao-paulo-o-despertar-do-gigante-por-jorge-maranhao/#respond Sun, 25 Nov 2018 12:30:04 +0000 http://www.avozdocidadao.com.br//?p=29767 O que vemos no Brasil é um grande embate entre duas grandes tradições culturais do Ocidente, o iluminismo e o barroquismo, por não conseguirmos reunir verdadeiras elites para empreender, enfim, a mudança do paradigma cultural da vã retórica populista para a ordem da razão no trato da coisa pública.


Por Jorge Maranhão – 24 de Novembro de 2018 às 12:06 

Todo cuidado é pouco para superar de fato nosso impasse civilizatório e vislumbrar uma nova era de efervescência cultural iluminista, que nunca vivemos, pois nosso esquerdismo tem sido a doença senil do barroquismo, e resistido como imaginário social o mais longevo a nos dominar a mente.

Nenhum de nossos maiores ficcionistas, profetas, sábios ou prestidigitadores, poderia imaginar esta verdadeira reviravolta dada por nossa cultura política nos últimos anos. Chamaria mesmo de radical torção, um verdadeiro cavalo de pau de nosso legado contorcionista.

Mesmo os grandes intérpretes do Brasil –e aqui enumero todos que inventariei em meu novo livro – como José Bonifácio, Joaquim Nabuco, Capistrano de Abreu, Euclydes da Cunha, Paulo Prado, Monteiro Lobato, Oswald de Andrade, Mario de Andrade, Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Viana Moog, Caio Prado Junior, Guimarães Rosa, Meira Penna, Roberto Campos, Darcy Ribeiro, Raimundo Faoro, Roberto DaMatta, José Murilo de Carvalho, Affonso Romano de Sant’Anna e outros, denunciaram causas e fenômenos singulares de nossas raízes culturais, como o patrimonialismo e o corporativismo, o familismo e o cunhadismo, o coronelismo e o patriarcalismo, o fisiologismo e o bacharelismo

Mas nenhum culminou no fenômeno mais abrangente, e causa última a meu ver, de todo o complexo cultural brasileiro como o barroquismo, do qual estes outros lhe seriam meros caudatários ou mesmo de incidência setorial nos âmbitos da vida social, familiar, artística, econômica, política ou moral, com suas características mais gerais de gosto pela retórica da farsa, do paradoxal, da ironia, alegoria, paródia e hipérbole.

Aliás, neste meu novo livro, faço um vasto inventário de nossos costumes barroquistas, em todos os campos da expressão cultural nacional para além das artes e das letras barrocas, e que podem ser simbolizados pelas figuras centrais das volutas e espirais barrocas, sobretudo como figuras de representação retórica do paradoxo, da farsa, da ironia e da hipérbole.

A começar pelo “rolo”, de onde deriva “enrolar”, como dobrar algo em torno de sua própria matéria, demonstro que a farsa, como mentira, é um dos vocábulos de maior sinonímia da língua portuguesa falada no Brasil, chegando a quase uma centena de ocorrências.

Cito apenas as mais folclóricas para o leitor checar seu próprio conhecimento: burla, farsa, mentira, caô, rolo, enrolação, broma, trapaça, fraude, falcatrua, fajuto, golpe, mutreta, treta, engodo, embuste, patifaria, ardil, cilada, troça, tribofe, bilontra, brinca, manobra, tapeação, tramoia, lorota, enredo, ludibrio, embromação, trama, aldrabice, dolo, deboche, galhofa, bufonaria, balela, fábula, lenda, conto, peta, patranha, pulha, moca, lesa, peraltice, potoca, maranha, embrulho. Todavia, a mais significativa de todas é “logro” (do latim lucru) que sustenta a ambivalência moral de nosso próprio caráter entre lucrar e lograr, lucro e logro.

Por outro lado, quantas cornucópias, quantas espirais e volutas, habitam em nossas mentes depois de cinco séculos de barroquismo legado de nossas artes e letras para nosso imaginário social, nosso inconsciente coletivo e mesmo nossa identidade cultural?

Não foi à toa que, entre figuras como anomitas, chifre de cabra, shoffar, trompa, cabos de violinos, caracóis, caramujos, tranças indígenas, gavinhas florais, labirintos, torres de Babel, capitéis de colunas jônicas, baldaquino e escadarias do Vaticano, propostas como capa de meu novo livro, preferi esta figura insólita de uma caveira humana com o cérebro retorcido em forma de espiral. Redobradas e desdobradas formas de se ir para a direita pelo sentido da esquerda e para a esquerda pelo sentido da direita.

Somos assim mesmo, o estilo da arte barroca do século XVI, sem a mediação e temperança da boa forma e da justa medida da Renascença que lhe antecedeu, nem tampouco da prudência e do equilíbrio da cultura iluminista que lhe sucedeu, desde o século XVII e XVIII, transbordou para todo o complexo cultural brasileiro, nossa chamada mentalidade barroquista, nosso apego a uma visão de mundo moldada em torções, contorções e distorções da realidade. Enfim, nosso espírito hiperbólico, irônico, alegórico, paradoxal, parabólico, farsesco e burlesco, com que vemos, nos inserimos e tratamos tudo em nossa volta. E reviravolta.

Meio a nosso barroquismo moral pleno de relativismo, os recursismos de nosso judiciário plenos de atenuantes e agravantes e a burla e a farsa de nossa política que quer a todos enganar por todo o tempo, eis que um capitão imbuído dos valores da ordem, da disciplina e hierarquia aprendidos no Exército, se empenha em levar ao cenário central de nosso barroquismo político, o Congresso Nacional, o bom senso e a clareza do senso comum, tal qual a fábula “O rei está nu”, de Hans Christian Andersen.

Só não ouviram os que não quiseram ouvir a voz do capitão que representava a indignação de milhões de cidadãos desde as megamanifestações de 2013 em repúdio aos desmantelos e esbulhos de nossa classe política.

A partir daí, tem sido definitivo o exercício de outro valor muito caro aos militares, a humildade de reconhecer seus próprios limites e se cercar dos melhores de cada área em que terá de atuar.

Assim, o capitão está a convocar os melhores generais para a defesa, a infraestrutura e a segurança institucional, um dos melhores pesquisadores para a ciência e tecnologia, um dos melhores economistas para a economia, um dos melhores diplomatas para a chancelaria e um dos melhores magistrados para a justiça.

E o que pode significar isso se não o esforço definitivo de passamento de nosso barroquista imaginário de salvadores da pátria, reencarnações sebastianistas de falsos profetas, líderes carismáticos de baba de quiabo de que sempre fomos vítimas? Senão a oportunidade histórica de passarmos para uma era iluminista de afirmação do bom senso e da justa medida, de desapego, enfim, pelo adjetivismo, ornamentalismo e as desmesuras da vã retórica?

Para além de um novo governo, o que vemos no Brasil é um grande embate entre duas grandes tradições culturais do Ocidente, o iluminismo e o barroquismo em que temos vivido imersos todos esses séculos, por não conseguirmos reunir verdadeiras elites para empreender, enfim, a mudança do paradigma cultural da vã retórica populista para a ordem da razão no trato da coisa pública.

Em que pese o sono esplêndido, não podemos deixar escapar tamanha oportunidade de despertar o gigante.

Jorge Maranhão, mestre em filosofia pela UFRJ, dirige o Instituto de Cultura de Cidadania A Voz do Cidadão e autor de “Destorcer o Brasil. De sua cultura de torções, contorções e distorções barroquistas”

 

 


]]>
https://www.avozdocidadao.com.br/artigo-do-diario-de-comercio-de-sao-paulo-o-despertar-do-gigante-por-jorge-maranhao/feed/ 0 29767